Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil
A ABCP realizou o “Webinário BPSR – A Crise Yanomami: causas, enfrentamento e perspectivas” no dia 29 de março de 2023. O encontro debateu as medidas necessárias e a contribuição da ciência política para evitar tragédias semelhantes. Os participantes compartilharam conhecimentos e experiências sobre o território Yanomami, sua história, cultura e organização, além de avaliar criticamente as políticas públicas e a legislação que deveria oferecer proteção para essa comunidade.
Participaram do encontro o diretor de projetos da ABCP, Rogério Arantes, e o editor-chefe do periódico Brazilian Political Science Review (BPSR), Adrian Gurza Lavalle, que também é presidente do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap). O webinário faz parte das iniciativas da ABCP, através da revista BPSR, para apoiar a pauta ambiental no contexto brasileiro.
A cientista social Dolores Silva, integrante da ABCP e professora da Universidade Federal do Pará (UFPA), conduziu as discussões que contaram com as participações de Dário Kopenawa, líder indígena do povo Yanomami e vice-presidente da associação Hutukara, Juliana Batista, mestre em direito e advogada do Instituto Socioambiental (ISA) e Estêvão Senra, geógrafo e analista sênior do Instituto Socioambiental.
Crise em debate
Dário Kopenawa afirmou que a crise sanitária e humanitária Yanomami não aconteceu por falta de comunicação com a sociedade e, principalmente, com os órgãos públicos. Nos quatro anos do governo Bolsonaro, as autoridades brasileiras e internacionais foram alertadas quanto à crise que estava minando as forças dessa comunidade.
“Nós (Hutukara, associação Yanomami) fazíamos alertas para os órgãos públicos e pedíamos apoio ao Estado brasileiro, a parlamentares e até mesmo a políticos europeus para evitar o agravamento dessa crise”, reforçou o líder. “É uma situação muito grave que enfrentamos hoje. Usamos vários elementos, perfis e redes para chamar atenção da sociedade não indígena. Alertamos quanto ao aumento do número de invasores e quanto ao agravamento dos casos de malária na Terra Yanomami”.
Não se sabe o total exatamente de invasores da terra. Estima-se que havia mais de 20 mil garimpeiros, observou Kopenawa. Ele conta que o garimpo está próximo das aldeias, por isso os Yanomamis estão morrendo de doenças, muitos em decorrência da contaminação por mercúrio. Essa crise humanitária é resultado, principalmente, da atividade e exploração do garimpo ilegal, pontuou Kopenawa.
A advogada Juliana Batista destacou no webinário que tanto a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil quanto a Hutukara ingressaram com ações no Judiciário pedindo uma série de medidas de proteção. Essas solicitações começaram a acontecer a partir de 2020, no início da pandemia, devido ao temor de como essa contaminação poderia ser mais agressiva entre povos indígenas de recente contato, como é o caso dos Yanomami.
“Também existia um receio que isso chegasse aos indígenas que vivem isolados, sem contatos sistemáticos com a sociedade nacional. Eles têm o sistema imunológico mais frágil e não tem resistência ao que chamamos de doenças comuns, como gripe. Imagina o coronavírus, que era uma doença completamente nova em nosso meio”, explicou.
O geógrafo Estêvão Senra analisou a origem dessa crise a partir da interação de dois vetores principais, que amplificam o impacto um do outro: a degradação do sistema de atendimento à saúde e o aumento exponencial da invasão garimpeira. O analista pontuou que a saúde Yanomami já apresentava há algum tempo indicadores ruins. Esse quadro foi agravado substancialmente nos quatro anos do governo Bolsonaro, quando a saúde da comunidade registrou um processo mais intenso de degradação.
"Essa postura negacionista do governo diante da crise e das constantes denúncias das organizações indígenas contribuiu para essa piora. Em outros períodos de crise, houve alguma mobilização para criar uma espécie de freio”, destacou Estevão.
A situação Yanomami
As comunidades que habitam a Terra Indígena Yanomami têm enfrentado interferências não indígenas na região por décadas, o que contribuiu com a degradação ambiental e a violência, gerando impactos diretos na alimentação e na saúde da população.
A crise sanitária e humanitária dos Yanomamis começou a ser divulgada pela imprensa mais intensamente a partir de janeiro 2023. As reportagens mostraram que mais de 500 crianças de até cinco anos morreram entre 2019 e 2022 devido a causas evitáveis, como desnutrição, contaminação por mercúrio e fome.
A terra Indígena Yanomami faz fronteira com a Venezuela e ocupa parte dos estados de Roraima e Amazonas, na região Norte do Brasil. Com três unidades de conservação, o território possui uma população estimada de 27 mil indígenas, conforme o Ministério dos Povos Indígenas (MPI). A terra abriga oito povos diferentes, entre eles, indígenas considerados isolados.
O “Webinário BPSR – A Crise Yanomami: causas, enfrentamento e perspectivas” está disponível no Canal do ABCP no YouTube.