top of page

A autonomia dos promotores públicos: lições do caso Lava Jato

publicabcp


No estudo Corruption and Separation of Powers: Where do Prosecutors Fit?, publicado no Hague Journal on the Rule of Law, as autoras Mariana Mota Prado (Universidade de Toronto), Marjorie Correa Marona (Universidade Federal de Minas Gerais) e o autor Fabio Kerche (Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro) examinam como diferentes níveis de autonomia dos promotores podem influenciar a governança e o combate à corrupção


A partir da análise do impacto institucional do Ministério Público no contexto da Operação Lava Jato no Brasil, o estudo ressalta os desafios e as consequências de equilibrar independência com responsabilidade em sistemas jurídicos democráticos.


O estudo classifica os Ministérios Públicos em três modelos principais, com base em seus níveis de independência e autonomia decisória: burocrático, eleito e autônomo. No modelo burocrático, os promotores estão subordinados ao poder executivo, como ocorre em alguns países europeus, o que pode limitar sua liberdade de ação. Já no modelo eleito, como em muitos estados dos Estados Unidos da América (EUA), os promotores são escolhidos por voto popular, tornando-se diretamente responsáveis perante o eleitorado, mas sujeitos a pressões políticas. 


Por fim, o modelo autônomo, como o brasileiro, é caracterizado por uma elevada independência em relação aos demais poderes do Estado, permitindo maior liberdade de decisão, mas com o risco de menor responsabilização.


A Operação Lava Jato, conduzida no Brasil a partir de 2014, exemplifica os potenciais e os desafios do modelo autônomo de Ministério Público. Com ampla liberdade de ação, os promotores brasileiros lideraram investigações que revelaram um dos maiores esquemas de corrupção já registrados, envolvendo empresas estatais, partidos políticos e grandes conglomerados econômicos. 


Contudo, o estudo destaca que a combinação entre alta independência e autonomia decisória resultou em consequências não intencionais, como polarização política, instabilidade institucional e impactos econômicos significativos. 


A Operação Lava Jato também trouxe à tona as consequências de práticas que, mais tarde, foram consideradas abusivas ou arbitrárias. Diversas condenações, como a do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foram anuladas pelo Supremo Tribunal Federal devido à falta de imparcialidade de julgadores e irregularidades nos processos. Além disso, o uso extensivo de instrumentos como acordos de delação premiada revelou fragilidades, sendo empregados, em alguns casos, de maneira seletiva ou com motivação política, resultando na condenação de indivíduos sem provas consistentes.


Esses episódios evidenciam os riscos associados à ausência de mecanismos robustos de controle sobre a atuação dos promotores, afetando também a credibilidade das instituições.


Com base nesse estudo de caso, os autores argumentam que a autonomia do Ministério Público é essencial para o combate à corrupção, mas deve ser equilibrada com mecanismos de responsabilização. Um modelo que conceda poder irrestrito a promotores pode resultar em decisões que desconsiderem as consequências sociais, políticas e econômicas de suas ações. 


Da mesma forma, a subordinação excessiva aos outros poderes pode comprometer a imparcialidade e a eficácia das investigações. O estudo sugere que o desafio central está em criar arranjos institucionais que garantam independência suficiente para proteger o Estado de Direito, sem abrir margem para abusos ou prejuízos à governança democrática.


As conclusões do estudo têm implicações importantes para a formulação de políticas públicas e o fortalecimento da governança democrática. Ao demonstrar os impactos de diferentes modelos de organização do Ministério Público, os autores oferecem uma base para que países em transição ou com democracias jovens avaliem cuidadosamente como projetar sistemas que combinem independência com responsabilização.


A análise da Operação Lava Jato destaca a necessidade de atenção aos efeitos colaterais das reformas institucionais e à criação de estruturas que preservem o equilíbrio entre autonomia e controle, fundamentais para o funcionamento sustentável do Estado de Direito.


Perfil dos Autores


Mariana Mota Prado é professora de Direito e titular da Cátedra William C. Graham em Direito e Desenvolvimento Internacional na Universidade de Toronto (Canadá). Bacharel em Direito pela Universidade de São Paulo e Mestre (LL.M.) e Doutora (J.S.D.) em Direito pela Universidade Yale (EUA).


Marjorie Corrêa Marona é doutora em Ciência Política e professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Coordenadora do Observatório da Justiça no Brasil e na América Latina (OJb-AL) e pesquisadora do Instituto da Democracia e Democratização da Comunicação (INCT/IDDC). 


Fábio Kerche é formado na Universidade de São Paulo (USP): graduação em Ciências Sociais e mestrado e doutorado em Ciência Política, com estágio na New York University (NYU). É professor da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), foi pesquisador titular da Fundação Casa de Rui Barbosa e research fellow do Center for Latin American and Latino Studies (CLALS) da American University, em Washington, DC. 


FICHA TÉCNICA

Título: Corruption and Separation of Powers: Where do Prosecutors Fit?

Autores: Mariana Mota Prado, Marjorie Corrêa Marona e Fábio Kerche 

Ano de publicação: 2024


Em Destaque

Newsletter

Associado:

Icone rodapé - avião Preto.png

Assine nossa newsletter

  Sua Inscriçãa foi realizada com sucesso!  

Siga nossas redes sociais:

© 2023 por ABCP - Associação Brasileira de Ciência Política, All rights reserved.

bottom of page